Homem-Aranha Através Do Aranhaverso Miles Morales

Análise a HOMEM-ARANHA: ATRAVÉS DO ARANHAVERSO

★★★★★ – É um portento de arte, de animação, de como contar uma história com um grande argumento: absolutamente imperdível!

As expectativas estavam obviamente altas em relação ao sucessor de "Homem-Aranha: No Universo Aranha", de 2019, mesmo sabendo que esta é ainda apenas a primeira parte de uma história que se desenrolará e culminará numa segunda parte.

Sabe-se agora que as expectativas não saem goradas e, aliás, conseguem ainda ser completamente excedidas. Continua a seguir-se a história de Miles Morales, o pequeno Homem-Aranha que se vê inadvertidamente um super-herói, mas que, aos poucos, vai descobrindo os seus poderes.

A história complexifica-se tremendamente, mas de uma forma muito justificada e com completo sentido, sem perder o rumo mesmo tendo em conta que se anteriormente os universos já eram mais que muitos, agora chega-se à fase dos pluri multiversos.

Homem-Aranha Através Do Aranhaverso multiversos

Assim, "Homem-Aranha: No Universo Aranha" dá por completo o salto em frente, sem medos, correndo imensos riscos, todos eles compensados no final. Por um lado, não perde da sua vista o sítio de onde vem, as suas fontes, vai buscar novamente a história de base, mostra-a ao espetador, presta-lhe tributo, não a esquece e faz questão de intensificar que os cânones não devem ser quebrados.

É especialmente o personagem Miguel O'Hara que encarna esta posição de forma mais rígida e é ele também que vai tentar impedir que as regras não sejam quebradas. É curioso que, mesmo no seio de um interminável mundo de universos dentro de universos, essas linhas guia continuam a ser imprescindíveis e isso mostra o quanto Phil Lord, Christopher Miller e David Callaham (autores do argumento) respeitam o passado da história.

Homem-Aranha Através Do Aranhaverso Miguel O'Hara

Por outro lado, partindo do passado unidimensional do Homem-Aranha, vai criar uma multitude de hipóteses e dimensões que apenas terminam quando a imaginação se esgotar. É uma viagem intensa não só para tentar salvar novamente o mundo e, agora, as várias dimensões de se destruírem mutuamente, mas ao mesmo tempo uma viagem de crescimento e descoberta pessoal, sobretudo de Miles Morales, acerca dos seus poderes e da sua identidade.

Mais próximo de si, Miles Morales terá de lidar agora com a sua némesis, o vilão Spot (a que Jason Schwartzman dá voz), chegando, pois, à maioridade enquanto super-herói. Spot é um vilão a preto e branco muito interessante porque é o completo oposto da colorida, vibrante e multicultural existência dos vários universos onde reside a multiplicidade de Homens-Aranhas.

Spot é o vazio emocional que se alimenta do seu próprio vazio para se tornar cada vez mais tóxico e, nesse aspeto, é ainda mais um passo em direção à grandeza desta história. Há uma preocupação em abordar muito mais do que apenas a história unidimensional da luta entre super-heróis e vilões, estes têm camadas de emoções e personalidade muito mais profundas do que anteriormente.

Homem-Aranha Através Do Aranhaverso Spot

Ao conferir a todos eles uma história de base, emoções, dilemas, dúvidas e até mesmo falhanços, "Homem-Aranha: Através Do Aranhaverso" dá o salto para a maturidade emocional, ultrapassa a sua história inicial para a enriquecer, mas sem a esquecer.

É ainda um piscar olhos a todas as gerações, tanto por ir buscar referências mais relacionadas com o passado (como quando surgem as versões mais antigas do Homem-Aranha agarradas às costas porque deram um jeito), como por trazer para dentro da narrativa os filmes live action ou os videojogos pertencentes ao universo.

Faz ainda questão de trazer para a mesa questões importantes como a da saúde mental, embora o faça recorrendo ao habitual humor inteligente e mordaz a que já habituou o seu espectador. Aliás, o personagem de Spot é disso um grande exemplo, dilacerado pela amargura e sem razão para viver a não ser a de acabar com Miles – é ainda um dos momentos mais altos no que diz respeito à animação propriamente dita.

As emoções estão sempre no centro das atenções, embora, claro, a animação seja a grande protagonista. Genial é o quanto essas emoções são transpostas para a animação, como no momento em que Gwen (uma das Mulheres-Aranhas e interesse amoroso de Miles) confronta o pai: a imagem de fundo desfaz-se, a tinta escorre pelas paredes, os personagens surgem incompletos, como que a refletir os seus estados de espírito dilacerados.

Homem-Aranha Através Do Aranhaverso Gwen

Se a animação é primorosa e não pára de espantar o espectador, são as ideias que "Homem-Aranha: Através Do Aranhaverso" carrega que o transformam num filme portentoso. Claro, a maioria lembrar-se-á das sequências animadas completamente únicas, da banda sonora sempre perfeita, dos diálogos certeiros, das conversas cheias de significado, do humor ou até dos cameos e isso é legítimo.

O que esta sequela faz, contudo, com a digestão do que pretende para os seus personagens transporta-a para um outro universo. Ainda assim, arranja espaço para desmultiplicar tudo, desconstruir a ideia de herói e até de vilão, trazer novos conceitos e preocupações para a linha da frente.

É ainda um filme muito inteligente com belíssimas interpretações de voz, não é por acaso que tem no seu elenco gente como Oscar Isaac (Miguel O'Hara), Issa Rae (Jessica Drew), Brian Tyree Henry (Jefferson Davis), Luna Lauren Velez (Rio Morales), Rachel Dratch (diretora da escola de Miles), Daniel Kaluuya (Hobart 'Hobie' Brown), Andy Samberg (Ben Reilly), Jason Schwartzman (Jonathan Ohnn aka Spot) ou Shea Whigham (George Stacy).

Por fim, a única coisa em que "Homem-Aranha: Através Do Aranhaverso" poderá pecar será por entrar na moda das sequelas partidas em duas partes, pelo que, apesar da sua considerável duração (tem à volta de 2 horas e 20), poderá ser frustrante no final ver aquela notinha do "To Be Continued" porque parece um pouco um anticlímax.

Mesmo assim, são tantas as excelentes razões para estar no cinema a assistir àquelas mais de duas horas de filme que essa sensação ligeira de frustração se transformará em expectativa em relação ao próximo. Afinal, quem não quererá saber como termina este imenso choque de titãs moderno?